Neuroses a varejo, de Aline Valek

A vida já é cheia de problemas para ainda termos que lidar com eles enquanto dormimos, não é mesmo?

Aline Valek é mineira, nascida em Governador Valadares, mas cresceu em Brasília, no Distrito Federal. Hoje mora em Munique, na Alemanha. Como descreve em sua mini biografia, já trabalhou como “redatora publicitária, redatora de conteúdo, colunista, editora, designer, ilustradora e escritora”, além de dar aulas de desenho, escrita e publicação.

Não lembro como cheguei até ela, mas provavelmente a internet me conduziu até a sua newsletter “Bobagens Imperdíveis”, na qual me inscrevi em novembro de 2016. Tem bastante tempo que a acompanho, recebendo e-mails e lendo suas reflexões periódicas. Nesse meio tempo, li um dos seus livros, As águas-vivas não sabem de si (Editora Rocco), sobre o qual já falei aqui no blog,  que mistura uma ficção um pouco científica e psicológica com profundezas abismais da escuridão marítima.

Recentemente, voltei a acompanha-la mais de perto pelo site Uma Palavra e me interessei em ler outro de seus livros, o “Neuroses a varejo“, uma pequena coletânea de contos curtos. Eu definiria esse livro como uma coletânea de pequenas histórias malucas fantásticas. Aline escreve muito bem e seus textos são extremamente prazerosos. Admiro sua criatividade. Foi através dela que conheci a Paula Gomes, inclusive, do interessantíssimo “Um garimpeiro, um padre, um médium, um detonador, um guia turístico e eu“.

Em “Neuroses a varejo”, (gratuito para quem tem Amazon Prime), encontramos quatro histórias bem diferentes e divertidas. É um tipo de humor e de escrita que me agradam bastante. Temos uma mulher que começa a desaparecer e procura entender o que está acontecendo com ela. Alguns destaques: “Priscila ficou apavorada com a ideia de desaparecer de vez. ‘Não precisa se desesperar. Só tente não se isolar demais”; “Descobriu que desaparecer tinha um gosto peculiar, e refletiu sobre isso na descida de volta à vila, enquanto aos poucos seus braços voltavam a ganhar consistência. “Você pode começar a gostar disso”, Murilo confessou. “Desaparecer vicia.” (posições 155 e 157).

Conhecemos, ainda, um caso raro de “gravidite encefálica”. Temos também gente tomando pílulas para sonhar e, por fim, o meu preferido, um conto sobre os desafios reais de se ter um nome sujo na praça – “Ele tinha cara de quem passava mais tempo no boteco que na academia, de quem fez faculdade de humanas e morava com duas vira-latas chamadas Clara Nunes e Gal Costa” (posição 677).

O prefácio, escrito por Bruno Anselmi, é uma excelente apresentação e, ao mesmo tempo, uma bela resenha do livro. Ao dizer das protagonistas, Bruno diz que “o foco recai sobre um tipo em particular, as solitárias, cuja solidão fantasticamente se manifesta sob a forma de doenças das mais diversas, como se tais sintomas espantosos fossem o único meio possível de explicar suas angústias” (posição 26).

Em outro trecho, ao dizer da ressonância da leitura em nós, Bruno comenta: “O espanto reside antes em se descobrir confortável consigo mesmo, em perceber-se mais sozinho do que nunca mesmo acompanhado ou ainda em abraçar a própria excentricidade intrínseca. Ou sentir tudo isso ao mesmo tempo, quase como se nos reconhecêssemos parasitas de nós mesmos” (posição 65).

Este livro de Aline Valek é uma ótima pedida para conhecer um pouco da obra da autora e depois passar a acompanha-la com seus textos habituais (e ilustrações, podcast, etc.). Recentemente, a autora escreveu um belíssimo texto em comemoração aos dez anos de sua newsletter. É uma linha do tempo não só do que ela passou nos últimos anos, mas do que todos nós temos vivenciado de alguma forma. Quem sabe começar por aí? Abraços e até a próxima.

2 Respostas para “Neuroses a varejo, de Aline Valek

  1. Grato, Rodrigo Padrini Monteiro, pela visita ao UAÍMA. Quanto a estas suas Páginas, elas fazem lembrar algo assim perene, com fartura, como a fartura e diversidade das feiras de rua, com seus odores, cores, risos, etc.

    Uma abraço.

    Darlan M Cunha (BÊAGÁ)

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