“Conta-se, em tom de anedota, que numa exposição de Henri Matisse uma senhora se voltou para o quadro Gypsy e disse ao pintor: “Nunca vi mulher de barriga verde…”, ao que ele teria replicado: “Minha senhora, isto não é uma mulher; é uma pintura” (JUNIOR, 2011).
Sempre cultivei um interesse particular na compreensão da relação entre a Psicologia e a Arte. Pessoalmente, me considero um apaixonado por música e um grande apreciador das demais manifestações artísticas, como: o teatro, a pintura, o desenho, a literatura e a dança.
A arte tem o poder de nos emocionar, de nos atingir de formas desconhecidas e também de expressar sentimentos que vão muito além das palavras. Como psicólogo reconheço, tanto a importância da palavra no processo psicoterapêutico, como das demais formas de expressão. A conhecida “cura pela fala” foi o princípio de toda uma estrutura da prática psicológica em todo o mundo e no nosso dia-a-dia, observamos fora do contexto terapêutico com frequência o poder de uma boa conversa ou de um simples desabafo.
Além das palavras
Como psicodramatista acredito também no poder da ação, da expressão corporal e na representação de papéis, como em um teatro, como ferramentas igualmente poderosas de cura e equilíbrio de nossa saúde mental.
Faço uso da citação de Junior (2011) para discutir o impacto da arte em nossa vida:
“… poderíamos sustentar que um texto em linguagem propriamente psicológica poderia provocar, no leitor genérico, impacto tão profundo e comovido quanto, por exemplo, o que provoca uma peça de Shakespeare ou um romance de Dostoievski? (JUNIOR, 2011).
A Psicologia, assim como a Filosofia, buscam desde tempos remotos descrever emoções, sentimentos, estabelecer relações de causa e consequência e processos mentais que nos definem. A partir da reflexão sobre nossa existência seria possível nos entender um pouco melhor. Não somos fáceis de decifrar.
No entanto, mesmo que possamos ler sobre o que é a tristeza e porque ela acontece, por exemplo, é frequente que uma música, uma pintura ou um livro de romance “nos entenda” melhor. Podemos nos sentir reconfortados por um teatro, um espetáculo de dança, mas não com um texto científico que fala exatamente sobre nossa emoção. Por que?
Segundo Junior (2011), podemos não nos reconhecer um texto científico, uma vez que a linguagem da arte é mais próxima de nossa experiência.
“Além disso, o próprio “efeito” da linguagem artística sobre nós pode se dar tanto pela catarse com base na “identificação” com um trajeto acidentado do herói, quanto pela tomada de consciência de aspectos até então insuspeitos da vida social, mediante profundo “estranhamento” aos signos da obra e/ou a nós mesmos em relação a eles” (JUNIOR, 2011).
“Mas, acima de tudo, a maior vantagem da narrativa dos romancistas é que ela se aproxima mais da experiência humana do que a maioria dos trabalhos e relatórios das ciências sociais” (BAUMAN, 2004).
Ao ser questionado sobre que acha que a literatura pode ensinar sobre a sociedade e sobre a condição humana, Zygmunt Bauman (2004) responde:
“Eu, por exemplo, me lembro de ganhar de Tolstoi, Balzac, Dickens, Dostoievski, Kafka ou Thomas More muito mais insight sobre a substância das experiências humanas do que de centenas de relatórios de pesquisa sociológica” (BAUMAN, 2004).
Confesso que já vivi experiências parecidas. Me recordo de realmente compreender algumas emoções humanas após ouvir uma música e entender sua história, ou ver um filme e me identificar com aquela personagem.
De forma alguma devemos dispensar o conhecimento científico, pelo contrário, é a partir dele que se estrutura boa parte de nossa sociedade. No entanto, nunca devemos deixar de considerar o poder terapêutico da arte, da linguagem artística, da emoção provocada por uma peça de teatro ou por um espetáculo de dança.
A arte é a genuína expressão da experiência de ser humano. Seja através de palavras, de gestos, de traços em um papel, de tintas em uma tela ou de acordes em um piano, é possível reconhecer senão nossa personalidade, pelo menos traços originais que expressam nossa capacidade de sentir e nos emocionar.
Referências
JUNIOR, Achilles Delari. DIÁLOGOS COM VIGOTSKI: PSICOLOGIA, EDUCAÇÃO E ARTE in Psicologia em Estudo, Maringá, v. 16, n. 2, p. 181-197, abr./jun. 2011
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Obrigado Andrea! Abraços!!
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Muito legal o texto, Rodrigo. Totalmente de acordo!
um abraço
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Com certeza, não tenho dúvida. As palavras podem muitas vezes limitar nossas experiências a um determinad conjunto de frases e expressões, pouco espontâneos. Abs
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As palavras nem sempre conseguem expressar e alcançar as nossas experiencias profundas, elas são limitadas, restringem o que vivemos. Assim creio que as expressões artísticas surgem como meios de nos fazermos enternder diante mundo e desta forma nos comunicamos de forma mais profunda, além das palavras!
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