De volta à cadeira de aluno #1

Hoje voltei a ser aluno começando o Mestrado em Psicologia. Minha primeira surpresa foi ao constatar que existe café à vontade para os alunos no intervalo. Olha que bacana! Na Graduação lembro que a gente comia pão de queijo na lanchonete. Acho que terei que ceder aos prazeres da cafeína.

Decidi que farei um pequeno diário semanal (ou quinzenal) das aulas no blog, das minhas impressões, descobertas e achados. A ideia é apenas registrar o processo, a evolução, a vivência da formação e do trabalho, sem nenhuma responsabilidade com a verdade definitiva ou saber empírico. Um hábito que tomo como diário de campo.

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É impressionante como um conceito é capaz de mudar a nossa forma de ver o mundo, não é mesmo? Por sinal, a nossa forma de ver o mundo diz muito da nossa forma de encarar e conduzir a própria vida. Deste modo, acho que conhecimento nunca é demais e faz todo o sentido.

Começamos com uma breve apresentação do curso. Normalmente, o Mestrado é cursado em vinte e quatro meses, num total de trezentos e sessenta horas de aula. Muita leitura e disciplinas no primeiro ano, muito trabalho e prática no segundo. Não que ocorra exatamente assim, mas é a ideia.

Metodologia de Pesquisa #1

É interessante como o teor de uma aula de Metodologia de Pesquisa no Mestrado pode soar tão diferente da disciplina de mesmo título na Graduação. Dessa vez, tudo faz mais sentido, é mais facilmente assimilado e se apresenta como um grande suporte para o que virá.

Algumas ideias aqui e ali, e pronto, temos um argumento excepcional sobre o trabalho que iremos desempenhar: o de pesquisador. Três autores se mostram essenciais neste início: Maria Cecília de Souza MinayoCharles Wright Mills e Peter Kevin Spink.

Devemos ter um pensamento claro, simples e direto. A obra Pesquisa Social: Teoria, Método e Criatividade de Minayo é uma das grandes referências para a produção de conhecimento nas ciências humanas e sociais. A autora destaca a metodologia como “caminho do pensamento e prática exercida na abordagem da realidade” (MINAYO, 2013, p.14) e fortalece o debate em defesa da pesquisa qualitativa.

Vivemos em uma época na qual o conhecimento científico é hegemônico, se colocando acima de conhecimentos religiosos, artísticos e culturais, por exemplo. No caso das ciências sociais, estudamos objetos essencialmente qualitativos, em constante transformação, parte de um processo histórico. Estamos fazendo ciência, de um outro modo.

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No argumento de Charles Mills, enxergamos o pesquisador como um artesão, produtor de uma obra única, onde trabalho e vida se interconectam. O ofício de investigador como um artesanato intelectual. Fica-nos a impressão de que devemos estimular a imaginação científica, a linguagem simples e clara, superando a ‘pose’ e a ‘prosa’ acadêmicas.

Me interesso muito por esse tipo de reflexão, já que se trata do nosso próprio ofício enquanto pesquisadores, mestrandos, futuros professores e orientadores. É uma reflexão sobre a prática, que produz conhecimento. A prática sobre a prática. Estamos olhando para nós mesmos com um olhar investigativo.

Nos trechos de Peter Spink, localizo a ideia de ‘campo-tema’, quando não mais percebemos ‘campo’ somente como aquele local ou espaço onde iremos colher nossos dados e retornar ao escritório para registrar nossas impressões. Para além da pesquisa de campo ou do espaço para produção de dados empíricos, ‘campo-tema’ é o argumento no qual estamos inseridos, uma rede de sentidos, o espaço debatido e negociado. Quando escolhemos nosso tema, motivado por nossa curiosidade, ele está em toda a parte. Insere toda a nossa mobilização, teórica e prática.

Trabalho e Criatividade #1

Sou suspeito para falar sobre essa disciplina, já que faz parte do meu projeto de pesquisa e é meu principal campo de interesse atualmente. Para começo de conversa, deixamos de entender trabalho apenas como emprego formal. Trabalho é toda atividade humana que nos distingue do fazer animal. Nossa atividade envolve a produção de cultura, de uma história, na mistura de elementos individuais e coletivos. Estamos transformando o mundo e nos transformando ao mesmo tempo.

A disciplina busca a ligação entre trabalho e criatividade, assumindo que o fazer humano sempre envolve (cri)atividade. Não devemos limitar esta última aos artistas, como se dependesse de um dom, algo inato a um grupo seleto de pessoas. Exercemos nossa criatividade diariamente, mesmo que não saibamos disso.

Karl Marx

Karl Marx

Sobre a criatividade, alguns autores como Winnicott, Vygotsky e Freud parecem essenciais. Quanto à distinção do trabalho humano do trabalho animal, uma passagem bastante utilizada de Marx sempre cai bem.

Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção dos favos de suas colméias. Mas o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo em cera. No fim do processo de trabalho obtém-se um resultado que já no início deste existiu na imaginação do trabalhador e, portanto, idealmente. (MARX, 1985, p.149-150)

Para tratarmos deste assunto utilizaremos autores clássicos como o próprio Marx, Hegel e as principais referências de abordagens Clínicas do Trabalho, como a Ergologia (Yves Schwartz), a Psicodinâmica do Trabalho (Christophe Dejours), a Clínica da Atividade (Yves Clot) e a Psicossociologia (Èugene Enriquez).

Espero que contribua bastante com as minhas reflexões sobre trabalho e adoecimento mental, já que o contato com outros projetos de pesquisa ajuda a expandir os horizontes do estudo por conta própria que eu vinha realizando até agora.

Teoria de Gênero #1

Se existe algum assunto atualmente para o qual a Psicologia está sendo convocada com urgência, este assunto é a categoria de gênero. Decidi cursar esta disciplina principalmente por saber muito pouco sobre o tema e me sentir atravessado, assim como imagino que grande parte das pessoas estejam, por todas as discussões e mudanças que vivemos hoje em dia.

Masculino, feminino, homem, mulher, sexo, desejo, papel de gênero. Buscando combater a naturalização e patologização dos comportamentos, as discussões sobre gênero despertam – e foram despertadas por – uma série de incômodos bastante necessários – muito associadas normalmente ao feminismo.

Ao citar a tradução literal de um dos livros que serão utilizados – Problemas de Gênero, Judith Butler -, encontramos um termo que define bem esse campo: encrenca. Nunca foi, não está sendo e nunca será fácil chegarmos a medidas satisfatórias e justas neste assunto.

Judith Butler

Judith Butler

A produção sobre gênero envolve poder, desigualdade social, processos de subjetivação e lógicas que se tornaram naturais, mas que não deveriam ser vistas como tal. Estamos lidando com o masculino e o feminino, com relações de poder assimétricas e desiguais. Estamos revestindo de dúvida o que era uma certeza, buscando definir um projeto político de vida coletiva, discutir a forma como conduzimos as coisas e transformar as relações.

Conclusões

Poucas, apenas que teremos que estudar bastante e que isso promete ser muito interessante. Até a próxima.

Referências

MARX, K. O Capital: crítica da economia política. Tradução por Regis Barbosa e Flávio R. Kothe. São Paulo: Abril Cultural, 1985. Livro 1, v.1, t.1.

MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.). Pesquisa Social. Teoria, método e criatividade. 33 ed. Petrópolis: Vozes, 2013.

5 Respostas para “De volta à cadeira de aluno #1

  1. Pingback: De volta à cadeira de aluno #2 | Mais uma Opinião·

  2. Seu blog é o máximo!
    Adorei o post, Rodrigo. Depois veja o texto indicado como leitura complementar ontem. Certamente há dicas legais para a tag “Diário de um mestrando”. Eis a referência completa:
    Paulus, T.M., Lester, J. N., & Dempster, P. G. (2014). Engaging in reflexive practice and making ethical choices. In T.M. Paulus, J.M Lester, & P.G. Dempster. Digital tools for qualitative research. (pp. 12-27). Los Angeles: Sage.

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